Há cerca de uma semana em um programa da TV paga, um importante embaixador explicava a uma jornalista que o problema da corrupção no Brasil nasce do fato de não sermos como a Inglaterra ou EUA. Entre nós a democracia é frágil, não existe participação popular. Em tudo esperamos do Estado e a sociedade civil não se mobiliza.
Parece-nos que a realidade seja mais complexa. Esse juízo descreve o Brasil real? Esse distinto senhor conhece nosso povo e seu empenho cotidiano? Quanto dessa opinião é só senso comum?
Quem vive a vida em nossos bairros, quem conhece o nosso interior, tem outra experiência. Quantas centenas de milhares de pessoas são atendidas em centros de saúde que surgiram da reivindicação popular? Quantos milhões de crianças são atendidas diariamente em creches comunitárias nascidas das igrejas e associações “amigos de bairro”? O que aconteceria se as centenas de Santas Casas de Misericórdia do Brasil fechassem? Um caos na saúde pública. E se fecharmos as creches comunitárias? A educação das crianças e a inserção das mulheres no mercado de trabalho sofreriam um golpe mortal.
Talvez o embaixador e o senso comum confundam ou reduzam “participação popular” apenas à possibilidade das pessoas de escolher candidatos nas eleições. E “política” às atividades dos partidos.
O Brasil possui uma história pouco divulgada de grupos e comunidades que trabalharam e trabalham para o bem comum. Isto é política. Um exemplo foi relatado pelo Lancet, uma das mais importantes revistas médicas científicas do mundo. Em sua série sobre o Brasil do último mês de maio, fala-se como a Pastoral da Criança, ação voluntária católica, foi uma das principais causas da queda da mortalidade infantil no país e está na origem do Programa de Saúde da Família, bandeira de nosso Sistema de Saúde. Isto é participação popular. Ou a Associação dos Trabalhadores Sem Terra de São Paulo que, sem ajuda do governo, já possibilitou que 60 mil pessoas tivessem seu terreno e casa, escolas e transporte, e nos últimos seis anos, acesso ao ensino superior para 50 mil de seus filiados. Isto chama-se mobilização popular.
Em cada cidadezinha brasileira encontram-se exemplos assim. Existe um povo, o nosso povo, que nos é desconhecido.
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